Agricultura viciada
Alberto Antonio de Oliveira
Fumaça, fábricas, lixo espalhado pelo chão, bitucas de cigarro, buzinas de carros, pichações por toda parte. Quando pensamos em poluição, logo vêm à cabeça os grandes centros urbanos. E ao pensar em tranquilidade e limpeza, lembramos daquele sitiozinho no interior... Mas, existe um tipo de poluição no meio rural que é tão ou mais nociva do que as fumaças que saem dos carros. Ela quase não é vista e sua origem é difícil de ser identificada. A poluição difusa no campo pode ser causada por dejetos de animais e pelo processo erosivo, acentuado pelo mau manejo do solo. E, junto com o solo desgastado, os cursos d’água também recebem resíduos químicos provenientes do uso de agrotóxico. É aí que mora grande parte do problema.
Os agrotóxicos, ou defensivos agrícolas, são substâncias aplicadas na plantação com o objetivo de combater as pragas e acelerar o tempo de colheita. Esses produtos vêm sendo utilizados no Brasil desde a década de 60. De acordo com dados da Associação Nacional das Empresas de Defensivos Agrícolas, entre 2008 e 2009 o volume de vendas no Brasil foi de mais de sete bilhões de dólares, o que representa a aplicação de 734 milhões de toneladas de venenos na agricultura – quase cinco vezes mais que a safra de grãos no Brasil de 2009/2010!
Engana-se quem pensa que só as grandes propriedades é que aplicam esses produtos. O coordenador do Projeto Manuelzão, Tarcísio Pinheiro, explica que também os pequenos proprietários adotam a prática. O agrônomo e doutor em Engenharia Agrícola, Edson Oliveira, associa o uso de defensivos agrícolas a uma certa tradição, uma ideia de que não é possível plantar sem agrotóxicos. O produtor aplica porque o avô dele aplicava, o pai dele aplicava e ele acaba aplicando também, sem saber o motivo”, exemplifica.
Como um remédio que provoca efeitos colaterais, também os agrotóxicos, aplicados em determinado local, acabam afetando outras regiões. Esses produtos se dispersam com o vento e, por meio da erosão do solo ou da água da chuva, acabam atingindo rios e córregos próximos. Sem contar que podem permanecer no solo onde foram aplicados por muitos anos, mesmo depois que a plantação já acabou. E até mesmo a embalagem desse “remédio” causa danos se o descarte não for feito de forma adequada.
Os riscos vão além dos recursos naturais e afetam a saúde humana. Tanto do consumidor final que coloca na mesa um alimento contaminado, quanto do produtor rural que é quem lida diretamente com a substância. Os agrotóxicos são absorvidos pelo corpo pelas vias respiratórias, pela pele e por via oral. Uma vez no organismo humano, podem causar intoxicação e levar a alterações imunológicas e genéticas, efeitos prejudiciais sobre os sistemas nervoso, respiratório, cardiovascular, além das reações alérgicas e até mudanças comportamentais. Estudos acadêmicos inclusive apontam a relação direta entre o uso constante de agrotóxicos e aumento do índice de mortalidade por câncer em produtores rurais de algumas áreas no Brasil.
O coordenador da fiscalização do uso e comércio de agrotóxicos do IMA, Thales Pereira, acredita que a redução de impactos dos defensivos agrícolas está em grande parte nas mãos do produtor. “A dificuldade é a questão educativa, a consciência do produtor de usar só quando realmente precisa e não desnecessariamente. É preciso que ele compreenda os malefícios que o uso indiscriminado de agrotóxicos pode causar e, mais ainda, como a diminuição no uso de defensivos pode agregar valor ao seu produto.
Essa pratica valoriza o alimento e, além de garantir a boa conduta agrícola, aumenta o lucro do produtor. As políticas de incentivo, também são importantes ações voltadas para a educação ambiental, com as comunidades rurais, com os consumidores e nas escolas e faculdades de agronomia.
Dá para viver sem
A agricultura livre de agrotóxicos é chamada de agricultura orgânica, ou agroecologia, e é uma alternativa para evitar os danos, ao meio ambiente e à saúde, causados pelos resíduos da agricultura tradicional. É uma forma de preservar os recursos hídricos, os solos e o equilíbrio ecossistêmico.
Na agricultura orgânica as pragas são combatidas sem produtos químicos, mas por seus inimigos naturais, como pequenos insetos. E, para fazer a planta crescer, é usado o processo de adubação a partir de dejetos de animais. Assim, evita-se um dos problemas causados pelos pesticidas, que é extermínio de outras espécies além da praga que se quer combater, o que prejudica o equilíbrio da cadeia alimentar. Essa forma de produção é também mais saudável, tanto para o consumidor quanto para quem lida diretamente com os agrotóxicos.
Fonte: Revista Manuelzão, outubro de 2010.
Autoras: Camila Bastos e Júlia Marques